comedor de ranho

No fundo, eu sou um chato de galocha

Para Augusto dos Anjos


não gosto de beber, meus amigos sim
não gosto de fumar, eles, aos poucos,
vão virando fumaça e subindo ao céu
não gosto de cinema, gosto de mim,
gosto de teatro, gosto de sangue, socos,
escândalos e um destemperado escarcéu.

não gosto de literatura, gosto de poesia,
ao verdadeiro poeta ergo Augusto busto,
e saio a celebrar, feliz e só, um bom verso
como se acertasse em cheio na loteria,
mas não gosto de jogos, sou tolo e justo
demais para o mundo egoísta e perverso.

não gosto de shoppings, nem de televisão,
não gosto de futebol, mas do ronaldinho,
não leio jornais nem revistas de peladas,
uma vez me caiu uma de literatura na mão,
só besteira e mistificação nesse mundinho
ególatra das "publicações especializadas".

não gosto de gangues, não gosto de moda,
gosto de vestir um pano qualquer e sair,
tomar um café na padaria da dona Marta,
depois voltar pra casa por outra rota.
às vezes, vou longe por não ter onde ir,
e retorno quando a madrugada já é alta.

a mãe não gosta quando me vê triste
ela diz que eu chorava muito na infância
gosta dos meus poemas e não sabe porquê
hoje, choro ainda, pois o menino resiste
e, dentro de mim, ele nunca se cansa
de querer ser o verso que está pra nascer!

Comedor de Ranho

posted by polacodabarreirinha @ 3:56 PM